Marcelo Silva de Souza Ribeiro
A onda neotecnicista que avassala a educação brasileira parte de alguns posicionamentos básicos que, em um primeiro momento podem até fazer sentido do ponto de vista prático, mas esconde limitações também práticas, interesses ideológicos e econômicos (embora se posicione em uma perspectiva de combate à ideologização da educação), além de não problematizar as questões da educação, tratando-a de forma simplificadora e a-histórica.
Essa onda neotecnicista descarta a importância do nível de escolaridade e a experiência do professor, questiona a necessidade de reduzir a quantidade de estudantes por sala, tripudia os teóricos da educação como Paulo Freire e coloca toda a questão da eficácia do ensino em algumas técnicas como atividades complementares, repetições e explicações sobre o conteúdo.
Certamente todos esses pontos podem ou não estar presentes na qualidade do fazer docente, justamente porque a educação é da dimensão da complexidade e cada situação deve ser analisada de modo relativo e levando em considerações os contextos.
No caso da experiência e escolaridade do professor, se não estiver voltada para os interesses da educação, o contexto da sala de aula e das intenções pedagógicas, realmente podem ser inócuos. Entretanto, dizer que não há relação entre escolaridade docente e experiência profissional no sentido de poder influenciar positivamente a aprendizagem é outra história.
Tripudiar os teóricos e as teorias que compõe a formação do professor é outra falácia. Uma coisa é quando a formação docente é recheada de teorias dissociadas da prática e livresca, mas isso não significa a sua negação. Na verdade a boa formação teórica fundamenta a prática reflexiva do professor. Muito possivelmente o que precisamos em termos de formação docente não é a negação da teoria (e dos teóricos), mas sua radicalização, sobretudo no que concerne a uma boa formação e articulação com o fazer docente.
As técnicas também são de extrema importância para a boa prática do professor e isso pode e deve ser ensinado aos docentes, mas acreditar que o domínio de técnicas poderá ser suficiente para assegurar a formação e o exercício profissional é, no mínimo, ingenuidade ou tentativa de esconder outros interesses.
O que chama atenção dessa atual onda é justamente saber de onde ecoam seus arautos. Um exemplo interessante é a matéria da Veja (15 de novembro de 2016), escrita por Claudio de Moura Castro, que é, por sua vez, ligado a empresa Positivo. Esses arautos são ligados, direta ou indiretamente, a empresas privadas que inculcam pacotes e receitas para os problemas da educação. Questões que incidem sobre a relativização da importância da qualificação docente como a graduação e a pós graduação, por exemplo, vêm ao encontro da lógica de mercado para o neotrabalhador da educação: não precisa de formação pedagógica, basta o conhecimento sobre o conteúdo e um "banho" de orientações e técnicas de ensino.
Se a onda tecnicista da década de 1970 que assolou o Brasil era uma política do estado ditatorial para o novo enquadramento da sociedade, o atual neotecnicismo é uma reengenharia da educação para colocá-la nas engrenagens das linhas produtivas do mercado globalizado. Se a educação tem seus produtos haverá de ser gestada industrialmente e ser rentável para atrair os investimentos, eis o que há por trás!
Publicado em https://www.pensaraeducacaoempauta.com/a-atual-onda-neotecnicista